(19) 38811647
(19) 996071686
zimmandrade@gmail.com

Interpretação de Imagens

Interpretação de Imagens

A interpretação de imagens desenhadas, pintadas ou em Sandplay apresentada por mim é desenvolvida a partir do referencial teórico da Psicologia Analítica Junguiana

Para compreender a importância que a interpretação da imagem pode ter em um processo terapêutico, precisamos, em primeiro lugar, nos perguntar por que uma pessoa faz um desenho ou uma pintura. As motivações podem ser muitas, desde o gesto espontâneo que procura expressar alguma realidade pessoal, passando pelo mero passatempo, até a colocação diretiva numa situação de diagnóstico ou de terapia. seja qual for a situação inicial que deu origem a uma imagem desenhada ou pintada, ela sempre será o resultado de uma manifestação do inconsciente e da realização, até certo ponto consciente, dessa manifestação. Representa a união dessas duas dimensões psíquicas, podendo também incluir aspectos mais antigos da experiência humana. Nesse caso, lidaremos com a dimensão arquetípica constelada na imagem diante de nós.

A Psicologia Analítica considera que a vida psíquica se dá predominantemente por imagens. Os conceitos seriam uma elaboração posterior da mente humana, representando uma atitude analítica, e, portanto, de divisão. A imagem emergente une e centraliza os fatos que estão constelados em um determinado momento do processo. Ela é como uma fotografia do momento de um indivíduo e, ao contemplá-la, podemos nos remeter ao outro lado da vida psíquica, comumente não percebido por não entrarmos em contato com ele diretamente.

            Como já falei acima, a pintura e o desenho podem ser sugeridos como técnica expressiva em um dado momento do processo terapêutico. Um deles, por exemplo, seria quando o paciente sonha pouco ou não traz nenhum material simbólico. Por outro lado, durante uma fase de produção excessiva de sonhos, o desenho pode ser útil para configurar o material simbólico e permitir o acesso a uma determinada temática inconsciente

Pintar ou desenhar podem ter então vários efeitos terapêuticos. Um deles é a canalização da energia contida, representando, portanto, a oportunidade de uma catarse. Isso, em si, já é benéfico, pois a energia pode redistribuir-se de uma maneira nova.

            Por outro lado, a imagem representada é a atualização de possibilidades até então não conscientes e a cristalização de material difuso que passa a assumir uma forma mais definida. Nessas condições, é possível um diálogo e, mais adiante, a integração dos conteúdos expressos. Outro aspecto interessante, que pode surgir com o hábito de expressar-se desenhando ou pintando, é a possibilidade de uma pessoa tornar-se menos dependente do terapeuta, uma vez que os conteúdos do inconsciente se tornam mais familiares e é possível lidar com eles sem tanto medo de que dominem o Eu consciente.

Está muito claro que esse hábito de expressar os conteúdos inconscientes através de imagens não substitui uma terapia, mas pode ajudar no que diz respeito à criação de um continente para os elementos do inconsciente que se acham constelados na dinâmica atual da Psique de um indivíduo.

            Podemos citar como precursores da interpretação de imagens o estudo da fisionomia e da grafia como base para o conhecimento do caráter e do psiquismo do indivíduo. L. Klages, filósofo e psicólogo alemão que viveu entre 1872 e 1956, desenvolveu uma pesquisa da expressão da fisionomia e da grafia. Antes dele, J. K. Lavater, filósofo e teólogo protestante suíço, que viveu entre 1741 e 1801, havia fundado o estudo da fisionomia como recurso de conhecimento do caráter. Finalmente, Ernst Kretchmer, psiquiatra e neurologista alemão, que viveu entre 1888 e 1964, colocou as bases para o desenvolvimento de uma tipologia humana a partir da constituição do tipo corporal.

No desenvolvimento de uma atividade interpretativa, a partir de Prinzhorn (1912) e depois com outros psiquiatras, psicólogos e terapeutas – Nise da Silveira, Aniela Jaffé, Susan Bach, Ursula Avé-Lallement, Tessa Dalley, Gregg M. Furth – que acreditavam na imagem como recurso terapêutico, foram se estabelecendo alguns princípios básicos:

  • não é possível interpretar adequadamente o desenho de um indivíduo do qual não se conhece a história de vida, sua situação no plano
    consciente e a situação psíquica de um modo geral;
  • nem sempre é indicado interpretar-se uma imagem; às vezes seria melhor deixá-la simplesmente presente, permitindo que o processo expressivo prossiga, trazendo material inconsciente à tona; por outro lado, muitas vezes é de grande importância interpretar uma imagem para impedir que ela de novo submerja no inconsciente e de lá atue sobre o Eu, dominando-o e inflacionando-o;
  • devemos levar em conta a função compensatória que as imagens muitas vezes exercem, para compreender a situação do indivíduo e interpretá-la corretamente;
  • ao interpretar, devemos iniciar com uma hipótese formulada a partir de uma característica central do desenho; por outro lado, uma característica central ainda não diz muita coisa sobre o desenho todo e o momento do indivíduo que o desenha; é necessário, portanto, estar atento durante todas as etapas do processo interpretativo.
  • Para a prática da interpretação, mostrou-se útil dispor de um esquema referencial que poderia desdobrar-se a partir dos seguintes aspectos:

1) A primeira impressão — O que chama a atenção na imagem? Como ela foi realizada, com cuidado ou apressadamente? O que está presente e o que falta? O que não se integra no todo?

2) O material usado:

  1. a) Que tipo de papel foi usado, papel adequado ou qualquer papel? A qualidade do papel pode ser um sinal do valor dado ao conteúdo expresso.
  2. b) Qual o meio escolhido para expressar-se: lápis preto, lápis de cor, esferográfica, tinta, nanquim, giz, giz de cera, tinta acrílica, aquarela, óleo. Cada um desses meios tem características próprias e certamente não é apenas por acaso que uma pessoa opta por um deles.

3) O formato do papel – desde muito pequeno até muito grande – é relevante com respeito a aspectos de auto estima e auto exigência. O posicionamento da imagem realizada, seja na horizontal ou na vertical, também pode fornecer indicações preciosas sobre as tendências presentes e a forma de relacionamento que a pessoa está estabelecendo no momento com seu ambiente.

4) A moldura presente ou ausente pode nos indicar se a pessoa é capaz de conter o material interior constelado, se valoriza ou acentua o que acabou de expressar e se permite o próprio envolvimento espontâneo com seu processo interior.

5) A organização, a coerência e a articulação dos elementos representados na imagem são extremamente importantes para evidenciar o posicionamento do Eu diante da realidade interior e exterior.

6)  A proporção dos elementos representados nos informa onde a energia psíquica está concentrada, qual a relevância ou, respectivamente, a insignificância dos eventos atuantes em sua vida. Tanto no item anterior como neste, é importante levar em conta a função compensatória já mencionada anteriormente, atuante durante a realização das imagens.

7) O movimento. Este aspecto, que pode ser percebido segundo as direções básicas no espaço: esquerda/direita, em cima/embaixo, dentro/fora, além dos movimentos mais gerais — evidenciados pela acentuação de formas e cores –, nos informa sobre a direção que um processo está tomando.

8) A capacidade de representação espacial do ser humano refere-se a um sistema de relacionamento entre os polos em cima/embaixo, frente/atrás, direita/esquerda, diagonais, centro/periferia, além das direções intermediárias. Fora desse esquema referencial, ele se sente perdido, solto, não pertencente a uma coisa definida. Essa vivência pode ser conscientizada através da projeção dos conteúdos interiores nos desenhos, pinturas e outros recursos expressivos. As regras de interpretação do simbolismo espacial podem variar, e cada terapeuta ou pesquisador ir formar seu próprio conjunto de conhecimentos a esse respeito.

9) A perspectiva indica a visão de mundo e expressa a posição do Eu diante dos fatos, além de imprimir vida aos conteúdos desenhados.

Há muitos tipos de perspectiva: a central, com um ponto de fuga; a linear, com dois pontos de fuga; a perspectiva da luz, a partir da acentuação da sombra; a perspectiva pela cor, acentuando a polaridade quente/frio. Elas podem estar referenciadas na atuação predominante de uma das quatro funções de consciência, respectivamente, sensação, pensamento, intuição e sentimento.

            A imagem realizada sem perspectiva indica, frequentemente, uma atitude de intelectualização ou de imaturidade ao lidar com os próprios conteúdos.

10)       A cor é portadora das emoções. Cada cor tem seu valor afetivo e seu efeito terapêutico. Existem vários aspectos a serem considerados nesse domínio: a polaridade quente/frio, a complementaridade, as nuanças, a harmonia e a dissonância, a intensidade e a quantidade, a pureza e a mistura. A cor predominante muitas vezes fala da função de consciência inferior a ser desenvolvida, ou, por outro lado, expressa a função dominante em plena atividade. De modo geral, as cores representam a boa ou má adaptação que uma pessoa tem à sua vida afetiva.

11)       Os números presentes na imagem, podem ser vistos como fatores de ordenação psíquica.

            “Vistos de um ponto de vista psicológico, os números naturais são sem dúvida representações arquetípicas, uma vez que nos levam a pensar em formas determinadas… Porém esses mesmos números são também uma propriedade dos objetos exteriores: mesmo quando os roubamos de todas as suas qualidades, como a cor, a temperatura, o tamanho etc., sempre resta a sua ‘quantidade’. E ao mesmo tempo esses números são também um conteúdo de nosso espírito, os quais podemos estudar sem relacioná-los aos objetos externos. Por isso, os números parecem ser a relação mais direta entre a dimensão da Psique e a da matéria”37 .

37 M. L. von Franz, Der Mensch und seine Symbole, p.310.